sexta-feira, 15 de junho de 2012

Segunda tem mais, digestão de inquietudes com Homero!

olá queridos,
Desculpem-me mas só agora me dei conta que os comentários do Homero a todas as questões apresentadas não foram postadas pelo Blog. Assim, reenvio para que possam tomar conhecimento e degustarem conosco!

Na próxima segunda, haverá outra reunião sobre o livro, assim se desejarem poderão postar novas questões e/ou pensamentos a respeito.

Beijo e ótimo fim de semana!
Flávia

1) Qual será o elixir do Homero? A seiva que irriga a vida...

2) Se desejamos felicidade, será que não encontraremos motivação suficiente e capacidade para buscar um novo caminho coletivamente?

Felicidade implica em autoconhecimento, em descoberta progressiva em um sentido da vida. Felicidade coletiva é euforia psicodélica, encontrável nos raves - no mais das vezes turbinada a drogas. E isso não é felicidade... é o lado maníaco de um estado maníaco-depressivo – e a depressão logo se seguirá.
Trabalhe cada um sobre si, busque inspiração na sabedoria dos antepassados e confie na própria intuição: o que está latente, se não for impedido de se manifestar, virá à tona. E aí cada um encontrará a felicidade possível a seu Ser – nem todas as felicidades são iguais em sentido para as várias individualidades, como então falar em felicidade coletiva?


3) A verdade nua e crua, segundo o livro, é que o ser humano não sabe viver diante das incertezas e por isso apoia-se nos dogmas (doxa) da religião. Alvoroço na mesa! E uma das presentes lança: não é verdade, hoje algumas religiões, até para se atualizarem, cultuam as incertezas também e te propõe ser mais crítico...

A problemática com as religiões é que se instituem , fatalmente – embora possam ter surgido por impulsos puros – em ferramenta de dominação e promessas que não passariam pelo Código de Defesa do Consumidor, porque são feitas por quem não as vai entregar e nunca se sabe se foram entregues: propaganda enganosa, portanto...
É oportuno para o momento para fazer uma ponderação: confunde-se amiúde - e gente de alto escalão intelectual faz isso - a possível continuidade da vida após largado o corpo físico (a continuidade da vida fora do corpo físico é uma das minhas crenças!) com a existência de um Deus; ou o contrário: entende-se que os ateus não creem na vida após a morte física, e parece que todos eles afirmam isso.
Há tantas coisas invisíveis no nosso cotidiano, como seria uma alma sem corpo, que por si não justificam que um deus exista para que elas existam. Por exemplo: o magnetismo, a radioatividade, os raios ultravioletas... ‘Como existe o magnetismo, Deus existe’, é aceitável esse raciocínio? Um bom tema pra refletir...


4) O livro traz uma profunda reflexão sobre religião e os deuses construídos. Religião tem sua origem no latim re-ligare, que seria ligar-se ao Sagrado. No entanto hoje vivemos a era da negação de si, a negação de ser quem somos. “Mercado, religião e ciência são luzes falsas para nossas sombras”.
Uma subdivisão muito interessante que Homero propõe é que ao invés de se pensar em um só Deus, como as religiões pregam, por que não pensar em vários cada qual com uma função? Por ex. Deus 1, como entidade organizadora, criadora da “mente cósmica”. Deus 2 que responderia aos nossos medos e incertezas. Ou então, um único Deus que contenha ordem e desordem, cosmos e caos, ao invés de só “fazer o bem”.

Rejeito a ideia de um deus como entidade antropicamente construída, dotada de onipotência e ocupada com os destinos individuais e o julgamento final da conduta humana, no post mortem; e, o que é pior, representada por seres humanos na face da Terra, que logo logo tratam de usar a palavra divina para fazer os devotos servos de si mesmos, não do senhor a que dizem servir.
Creio na existência de uma mente cósmica que abriga ordem e caos, fazendo com que o Universo e cada partícula nele existente sejam autogeridas por virtude dessa mesma mente, cujos propósitos de fato desconhecemos... Desconhecemos e não a controlamos: é uma ilusão que ‘controlamos’ nossas vidas ou algo que exista no entorno delas. Quanto ao bem, não é inerente ao conceito de Deus. Surge, de fato, da empatia, da compaixão: quando sentimos em nós o que o outro está sentindo. Isso traz um sentido de pertença, e atribuímos a origem desse sentimento à existência de um Deus, que teria o mesmo por nós. É que nesse momento especial, estabelece-se na relação entre duas pessoas, ou no seio de um grupo, a mesma condição de interdependência, que aliás está presente por todo lado no Cosmos, e isso se nos afigura ‘divino’.

5) O grupo quer saber qual é ou qual são os seus deuses?Entendo que a religação de nosso ser, implícita na religião, significa o reconhecimento de que somos partes orgânicas de um todo. Isso demanda que tenhamos feito o ‘trabalho’ sobre nós mesmos, a que alude Gurdieff.
Meu conceito de mente organizadora inclui a imanência: algo que está em tudo que conhecemos e que ainda não pudemos alcançar com nossas mentes. É a totalidade, que envolve as partes, que conhecemos ou ainda não conhecemos. Nesse sentido, me autodenomino ‘pagão’, ou seja, conectado ao pago, ou mundo tal como ele é na sua simplicidade estonteante. Considero-me um ‘pagão esclarecido’, este último qualificativo significando que tenho consciência dos motivos da escolha.


6) Por que tememos tanto a morte, se nascemos sabendo que morreremos? Seria por apego?A morte, a partir do momento em que tomamos, muitas vezes ainda na infância, contato com essa inevitabilidade, é a única certeza fundamental que nossas mentes abrigam. Mas há uma incerteza associada a essa inexorável certeza: é o ‘quando’. Permanece um segredo inextricável o momento em que deixaremos este mundo físico, em que pesem os Tarôs e mapas astrológicos da vida, os videntes, as cartomantes, as pitonisas,...
Na verdade, na maior parte do tempo esse temor se dissimula. Não é comum, principalmente nos mais jovens, ouvir dizer: ‘tenho medo da morte’. Isso acaba traduzindo-se pela fuga - diria instintiva, se o termo couber - da ideia de, de repente, tudo se acabar – pelo menos, aqui nesta realidade material... E essa fuga, esse temor da ação abrupta do deus Morte, nos põe, em maior ou menor grau, em posição de impaciência. Queremos que aconteça logo tudo que queremos, e o futuro passa a ter menor valor que o presente: como se diz em economia, ‘descontamos’ o futuro a taxas que correspondem a um cálculo invertido de juros. Quanto mais tempo avaliemos que durará a espera, mais tendemos para substitutivos de prazo mais curto: ‘quando chegar o que almejava, posso já ter-me ido embora...’.
Aí entra o deus Mercado, nos entretendo com a satisfação de desejos que portam uma ilusão de poder via posse, muito embora possuir uma dada cesta de bens básicos seja necessário para manter a própria
vida. O problema está em atrelarmos nossa identidade pessoal à posse de bens materiais, os quais cabe ao deus Ciência, por meio das tecnologias que dele derivam, nos disponibilizar para entreter-nos e mitigar nossa impaciência. Mas somos, individualmente, diferentes uns dos outros: o grau de impaciência varia de pessoa a pessoa, conforme suas crenças, lato sensu.
Vale assim falar das crenças e sua importância como determinante do comportamento humano. Muitas vezes, essa paciência estendida decorre da crença reencarnatória; ‘o que não consegui obter ou concluir nesta vida, posso fazê-lo na outra’. Outra dinâmica, só para exemplificar, seria delegarmos a uma instância superior – a bondade de Deus ou a intervenção de um santo de devoção – a capacidade de atuar em nosso favor, nos dando paciência e tempestivamente recompensando-nos com a conquista do objeto do desejo. “O Universo conspirará a favor...’.
Se há apego, parece-me que este se dá para com nossas ‘crenças’: é mais fácil, em geral, abrir mão de bens materiais ou afetivos do que de nossas crenças, quando estejam muito enraizadas em nossa mente.


 
7) Uma nova economia, não dependeria antes da mudança de nossos valores? Mas, como mudar o modelo mental? 
Certas realidades, como a Economia ou, para falar mais amplamente, nosso modelo civilizatório, foram sendo construídas ao largo de séculos. A valorização da posse de bens – territórios, artefatos, escravos! – foi uma constante na história das civilizações. Nessa escalada, não encontramos ‘mocinhos’, o que não significa que só tenha havido ‘bandidos’: o que sempre impeliu a ação humana foi o interesse e a busca de poder para satisfazer esses interesses. Interesses de indivíduos, de grupos, de nações...
Assim, se armou a Economia que temos hoje. Só um pequeno detalhe, que estabelece uma diferença abissal: ao longo dos séculos, dos milênios havia espaço para o crescimento contínuo, e nem tão distante no tempo. Em 1961, ocupávamos apenas 50% da biocapacidade do planeta, sem dúvida desigualmente: algumas regiões acabaram ficando mais devastadas, outras (o Brasil se insere nisso) ainda bastante intocadas.
Nos dias de hoje, detonamos, ou quase, a resiliência dos ecossistemas: ultrapassamos na média em mais de 50% a capacidade de autorregeneração desses mesmos ecossistemas, tornando os ciclos naturais cada vez mais lentos e incompletos. Até que cheguemos, e parece que não falta muito, a um colapso na capacidade de sustentar a cadeia alimentar e manter a necessária biodiversidade.
Como os modelos mentais estão assentados sobre valores, que por sua vez respondem a interesses que motivam a ação humana à satisfação de si próprios, quanto mais ficar esclarecido e difundido que, aritmeticamente, estamos muito próximos dos limites de suportabilidade dos sistemas naturais, mais chance teremos de operar mudanças nos modelos mentais dos que regem a Economia – sujeitos entretanto ao seu poder protelatório dos efeitos deletérios vindouros sobre si e sobre sua grei e, pincipalmente, se algum altruísmo, um tanto contraditório como característica humana universal, estiver ainda disponível.


8) Olá Homero, estou curtindo muito a leitura, mas falta bastante ainda para terminar... Até onde cheguei (estou por volta da pág 70), algo me saltou aos olhos... me colocando de frente à uma questão que estava dentro de mim, mas que eu ainda não havia me dado conta de sua complexidade - Vivemos numa sociedade capitalista baseada no crescimento pelo crescimento, que tem o lucro como o fim em si mesmo, num planeta que tem um sistema cíclico e limitado por seus recursos naturais. Está na cara que o homem desconsiderou por séculos e séculos esta realidade. Portanto, se faz necessário um novo sistema, uma nova ordem mundial onde de fato homem e planeta terra possam coexistir de verdade. O que acha disso?

Sem dúvida, você está certa, Dri! Novo sistema, nova ordem mundial -- são condições absolutamente necessárias para que possamos continuar a viver a experiência humana sobre o planeta.
Estivemos iludidos por milênios com que a Terra, tão rica e portentosa, nunca se esgotaria como sustentáculo da vida. O progresso tecnológico dos últimos 60 anos avançou de forma voraz sobre os ecossistemas, sem contudo gerar um acesso equitativo de benefícios aos vários povos e regiões, o que até de certa forma seria uma consolação quanto aos danos causados ao mundo natural.
A Rio+20, que ora se inicia, deveria ter como lema uma nova ordem mundial, não apenas uma nova economia, a já desgastada Economia Verde. 

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