terça-feira, 22 de maio de 2012

Encontro com homem notável: Homero Santos conversa sobre seu livro A Caveira de Hamlet

De um convite inusitado surgiu este encontro. Minha cunhada Tarcila, apreciadora de saraus, convidou-me para mais um em sua casa, explicando que seria uma reunião de amigos da comunidade Ethos. Em meio a tantos convidados queridos e bons tenores, reencontrei o Homero Santos. Cheia de novidades para contar, nem imaginava a maior: Homero havia acabado de lançar um livro sobre reflexões e "questionamentos mal comportados sobre a vida, a verdade e o futuro". Deste título tão instigante, surgiu o convite que foi de pronto aceito.



Homero, figura humana despretensiosa e acessível, é entretanto uma pessoa cheia de predicados. Foi executivo de várias corporações, professor e pesquisador da Fundação Dom Cabral por vários anos e consultor convidado para estruturar a área de educação para a sustentabilidade no Instituto Ethos e no SEBRAE, entre outras realizações. Foi fundador e primeiro coordenador, e hoje é membro, da Comissão de Estudos de Sustentabilidade para as Empresas do IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, e se tornou uma referencia no tema da sustentabilidade. Mas o livro ‘A Caveira de Hamlet’, seu último feito, Homero não o elaborou sozinho. Escreveu-o em co-autoria com sua filha Maria Fernanda Cardoso Santos, o que enobrece o diálogo entre a visão feminina e masculina.

Já de início, a postura chamou-me a atenção na leitura. A proposta não é trazer respostas, mas ampliar as perguntas. Neste sentido propõe uma meta mensagem, em que todos somos capazes de lidar com temas profundos, sair da “zona de conforto” e começar a pensar e agir mais livremente, “senhores de si”. Na estrutura do livro um tema foi puxando o outro, como em nossas reuniões. Gostei disso.

Em seu discurso, ou melhor, conversa com sua filha, Homero navega pela filosofia, mitologia, sabedoria de vida e sustentabilidade. E nós leitores, vamos dá simples leitura, que não é simples, mas recheada de palavras sofisticadas e de grande significado, a atores em meio a uma peça repleta de personagens de todos os tempos.

De repente, Nietzsche grita: Deus está morto! E Homero discorre sobre o que isso sugere: o materialismo e toda sua conjuntura sufocaram nossa espiritualidade, com valores débeis onde representantes “Dele”, em proveito próprio, atraem fiéis em defesa de algumas classes humanas em troca de salvações divinas. Perdemos a capacidade de ver o todo, e continuamos olhando o próprio umbigo.

Segundo Homero, na atualidade somos governados por três deuses, o Mercado que pelo consumo desenfreado nos “cega”, a Ciência geradora de tecnologia que fabrica  produtos cada vez mais desejados e, por fim, a Morte a única com poder de frear o consumo. O individuo quer apenas viver o aqui e agora, não se preocupando com as gerações futuras. Faço um parêntese, pois do ponto de vista do autoconhecimento, o que mais se recomenda é “viva o aqui e agora”, mas com o sentido de sintonizar sua essência com as pessoas e a natureza à sua volta em total harmonia, a fim de extrair o melhor de seu potencial.


Cada uma das participantes leu um capítulo a sua escolha para conversar com o autor. As perguntas prosseguiam. Temos a impressão que hoje somos mais otimistas devido a tantas iniciativas pró sustentabilidade e questões de sobrevivência implícitas. O que acha? Lança uma delas. Os otimistas são os pessimistas mal informados. Negamos o óbvio e acreditamos no impossível! Retumba Homero e completa: Rio + 20 pode ainda ser apenas ilusório. Sentencia: em 2014 podemos esperar pelo grande crack financeiro. Muito maior que o de 1929.

As corporações só desejam o lucro mais rápido, nem as empresas de alimentos formais acreditam na agricultura orgânica, porque não estão interessadas em mudar o sistema convencional. Então, contribui uma participante, deveríamos deixar de pensar em países e começar a pensar como um planeta? Pairam reflexões no ar.

Como equilibrar o consumismo desenfreado, os carreiristas narcísicos, e o pensar individual pelo coletivo, questiona outra e já propõe: Dever-se-ia levar autoconhecimento como disciplina para as escolas? No livro a questão é bem discutida. Enquanto valoriza-se o inovar, que estimula o crescimento e a produção, os quais geram aumento de lixo e diminuição dos recursos naturais, a fome mundial continua na mesma. Faz-se absolutamente necessário reinventar a economia. O ideal seria decrescer, mas isto é contrário às grandes corporações e à própria evolução de nossa espécie.  Neste contexto, segundo o autor, a economia sustentável seria apenas um refresco para a situação. E finaliza, “não turbine a lagarta, deixe-a morrer para virar borboleta”.

Como romper o impasse do crescimento versus o bem estar? No livro, Homero cita o conceito de Vicki Robin, por meio da Simplicidade Voluntária.

“A resiliência do planeta está diminuindo sua capacidade de regeneração. Em 1960, 50% do planeta era considerado intocado, hoje este numero caiu a metade.”

“Existe uma forte resistência à mudança devido ao modelo mental, que é regido pelo poder econômico.”



“A luz do equilíbrio Yin & Yang, será necessário o resgate feminino. Em outras palavras, o ser feminino necessita do ser masculino e vice versa. Enquanto o feminino acolhe, nutre e inspira, o masculino é o crescimento indefinido.”

Nosso “aperitivo” com o autor apenas abriu nosso apetite em nos aprofundar na leitura e propor mais uma reunião sobre o tema. A Caveira de Hamlet promete muito mais reflexão. Convidamos a quem possa interessar que nos acompanhe na leitura e traga questões sobre o tema, que em nosso próximo encontro serão respondidas aqui no Blog pelo autor.

 
Para adquirir o livro, acesse: http://canal6.com.br/ed/index.php
/2012/03/28/a-caveira-de-hamlet/ ou na Amazon, como ebook.

9 comentários:

  1. Maria Fernanda Cardoso Santos1 de junho de 2012 às 15:19

    É um grande prazer conhecer a Casa Deg Filó, ainda que virtualmente. Acho a ideia muito boa e desejo mais e mais sucesso! Quando eu estiver por essas bandas vou querer conhecer pessoalmente...


    Fico muito contente de que estejam gostando do livro - é realmente gratificante ver que a conversa que iniciamos, meu pai e eu, continua e ganha cada vez mais interlocutores :)


    Ah, sim: Já me subscrevi para receber as notícias de vocês. Obrigada pelo convite.


    Grande abraço e até mais,
    Fernanda

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  2. Hoje, lendo o livro, me chamou muito atenção um trecho: "A doxa-mater, a palavra mágica, o meme-mestre que tem sempre imperado sobre as nossas vidas individuais e a nossa existência coletiva, sobre a nossa vida comunitária, é: CRESCIMENTO!
    Assim, a biosfera cresce – é a lógica dos genes; a noosfera, reino da mente humana, comanda ações de crescimento da nossa espécie como valor máximo – é a doxa¹ fundamental de sempre; contudo – e é aí que reside o trágico – a geosfera é estável, para não dizer limitada... Por conclusão, essas são três realidades que inevitavelmente se desencontram!".
    Ou seja, como sustentaremos o crescimento, que é nato da civilização humana, num planeta estável, limitado? Quando teremos a humildade e a coragem de nos “render” ao planeta, e, a partir disso, mudarmos o doxa, transformando, assim, o nosso VIVER?

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    1. Acho que a sequencia desse drama se dará como crescentes distúrbios sociais, financeiros e ambientais que, num momento não muito distante à frente, nos assolarão. Em face da desorganização que se criará, estaremos -- somente aí -- motivados a fazer as alterações, já então inadiáveis, no nosso modelo civilizatório. E, quem sabe, então esse meme nefasto, esse vírus do "crescimento" seja destronado, mas... qual vai ser o próximo?
      Somente uma consciência ampliada, temperada pela compaixão, nos libertará de qualquer doxa ou meme que nos possa conduzir a caminhos penosos. Mas não nos esqueçamos de que tudo isso é oportunidade de aprendizado e construção de sabedoria para a espécie humana...

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  3. Olá todos queridos e queridas!
    Estou em alta expectativa sobre essa “sabatina”... bem-vinda sabatina!!!
    Vale qualquer gênero de colocação suscitada pelo livro “A Caveira de Hamlet”: dúvidas, perguntas, questionamentos – aliás, é o que livro mais faz o tempo todo! – e discordâncias. Sim, discordâncias também! Tudo isso é o processo da “parteira”, a maiêutica de Sócrates: por aí, se chega a conhecer mais sobre si próprio, sobre os outros, sobre a Vida...
    E também são bem-vindos comentários que possam acrescentar ou reforçar algo ao que já tenha sido dito pelos autores.
    Bem... estou aqui de prontidão, embaixo do travessão, aguardando as bolas chegarem. Decerto, vão passar alguns “frangos”, mas é parte do jogo... um jogo onde todos ganhamos!
    Abraços e beijos!
    Homero

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  4. Olá Homero, estou curtindo muito a leitura, mas falta bastante ainda para terminar... Até onde cheguei (estou por volta da pág 70), algo me saltou aos olhos... me colocando de frente à uma questão que estava dentro de mim, mas que eu ainda não havia me dado conta de sua complexidade - Vivemos numa sociedade capitalista baseada no crescimento pelo crescimento, que tem o lucro como o fim em si mesmo, num planeta que tem um sistema cíclico e limitado por seus recursos naturais. Está na cara que o homem desconsiderou por séculos e séculos esta realidade. Portanto, se faz necessário um novo sistema, uma nova ordem mundial onde de fato homem e planeta terra possam coexistir de verdade. O que acha disso?

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    1. Sem dúvida, você está certa, Dri! Novo sistema, nova ordem mundial -- são condições absolutamente necessárias para que possamos continuar a viver a experiência humana sobre o planeta.
      Estivemos iludidos por milênios com que a Terra, tão rica e portentosa, nunca se esgotaria como sustentáculo da vida. O progresso tecnológico dos últimos 60 anos avançou de forma voraz sobre os ecossistemas, sem contudo gerar um acesso equitativo de benefícios aos vários povos e regiões, o que até de certa forma seria uma consolação quanto aos danos causados ao mundo natural.
      A Rio+20, que ora se inicia, deveria ter como lema uma nova ordem mundial, não apenas uma nova economia, a já desgastada Economia Verde.

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  5. Continuando meu raciocínio...
    Estamos vivendo, neste momento presente, um dilema:
    - Crescimento, tal como ele vem acontecendo, afeta o planeta
    - Decrescimento, como uma solução para isto, afetaria o homem
    "Se correr o bicho pega, se ficar, o bicho come!"
    Resta, portanto, termos a humildade de reconhecer, como espécie, que erramos no que diz respeito à forma como vivemos neste planeta. Todas estas conversas, convenções, etc, entre as nações, tendo a sustentabilidade como pano de fundo, são provas deste reconhecimento... mas, enquanto não for um reconhecimento geral e irrestrito, continuaremos no mesmo ponto: no discurso.
    Se já é difícil o reconhecimento, imagine como seria, à partir do momento que admitíssemos o erro de fato, termos a coragem de sair do discurso e partirmos para a prática.
    Sair do capitalismo e migrar para a sustentabilidade, tal como ela deve ser, não é fazer ajustes no capitalismo, mas, sim, mudar completamente o "rumo da humanidade"...Um abraço, Adriana.

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    1. Acredito, Dri, que de certo modo já comentei esse seu mui bem estruturado raciocínio, quando disse, acima -- ainda que com outras palavras -- que o desfecho deste dilema que estamos vivendo será um grande aprendizado para aqueles que sobreviverem e despertarem para valores éticos superiores. É o fluxo da vida...

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    2. Agradeço seus comentários. Você apresenta toda esta questão com muita lucidez... ajudando a esclarecer alguns pontos e reforçando meus pensamentos e sentimentos. Vamos continuar esta conversa! Conforme conversamos no evento do Ethos, vamos montar um grupo de discussão do livro! Um grande abraço, Dri Jazzar.

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